Fui provocado pelo meu filho de 15 anos nesta semana. Aquele menino super conectado e familiarizado com suas traquitanas eletrônicas estava um tanto frustrado. Depois de rodar por várias livrarias do bairro a procura de um livro de Machado de Assis, voltou pra casa de mãos vazias e uma notícia que não bateu bem pra ele: teria que comprar o livro pela Internet. Na verdade, ele baixou de graça, mesmo assim com uma cara de que preferia ter encontrado o objeto.
Durante a conversa com o Milton Young hoje na CBN, percebemos que esta frustração é comum entre brasileiros atualmente. As livrarias, por redução de custo, diminuem seus estoques de livros que não têm giro alto e direcionam suas operações cada vez mais para o mercado de lojas online.
Eu mesmo senti a dor desta ferida quando notei a transformação da livraria Laselva do aeroporto de Congonhas, até então meu oásis literário pré-voo, se transformar em um espaço híbrido onde o café parece ter mais destaque do que os livros que ficaram de escanteio.
Os fatos não param. A Fnac, há duas semanas, anunciou a dificuldade para manter sua operação de lojas físicas no Brasil e aguarda socorro do mercado. Até na minha doce Ituverava, interior de São Paulo, as livrarias viraram há tempos bichos em extinção.
Mas não temos motivo para o choro. Assim como as locadoras desapareceram abrindo espaço para os streaming de vídeo, estamos assistindo na primeira fila a transição da leitura em papel para os meios digitais.
A primeira etapa é comprar livros físicos pelas lojas online. A segunda, que já rotina para uma minoria dos leitores ainda, é pagar apenas pelo conteúdo dos livros para ler dos seus tablets, celulares, computadores ou Kindles.
Assim como aprendemos usar o Youtube e Netflix, a leitura dos e-books requer uma educação de hábito coletiva. Neste caminho, a livraria Cultura, que também tem sofrido com a redução dos lucros nos últimos anos, está aproveitando a oportunidade. A livraria controlada pela família Herz disponibilizou 10 mil títulos gratuitos em seu site. Para ter acesso, você precisa fazer um cadastro e o download da plataforma de leitura de livros digitais Kobo, um concorrente do Kindle que faz parceria com a livraria Cultura.
Para seguirmos nesta transição, é fundamental o apoio dos legisladores. O incentivo fiscal e ajuste de leis são fundamentais para avançarmos neste quesito.
O mundo está desmaterializado. Música, filme, livros e até o próprio dinheiro. A reversão disso fica apenas para os capítulos da nostalgia futura, assim como ocorre com os vinis que ressuscitaram em pleno auge dos Spotifys da vida.
Às livrarias, resta o papel fundamental se transformarem em algo que os smartphones não são capazes: a experiência coletiva. Encontros literários, teatro, debates e calor humano. Compartilhar conhecimento na vida real.
Não é o fim, mas a travessia de uma ponte de consumo para um território com infinitas possibilidades.