A vida em rede: mais prática e mais frágil

Por Marcelo Tas

Vida em rede. O jargão faz mais sentido a cada ano. Semana passada, depois de passar uma semana glamurosa em Saint Tropez, Cannes e Mônaco, encarei o perrengue do pingue-pongue aéreo entre conexões e cancelamentos de voo. 

Como bem lembrado pelo Milton Young em nosso papo hoje pela manhã na rádio CBN, a malha aérea também é uma rede. Enquanto eu buscava distrações entre um pouso e decolagem, quem passava sufoco mesmo era a British Airlines. Um apagão no sistema da companhia aérea deixou 75 mil passageiros na mão. 

Enquanto o presidente da companhia pedia desculpas em um vídeo publicado no Twitter oficial, uma investigação interna foi instaurada para entender o motivo da pane que provocou o cancelamento de pelo menos mil vôos ingleses. Entre atentados terroristas e bugs de algoritmos, a resposta até então parece ser um tanto mais analógica: uma mão humana. 

De acordo com uma nota publicada no Times, tudo indica que um terceiro contratado para fazer uma manutenção no banco de dados desligou sem querer toda a rede de energia que abastecia o controle central de computadores da British Airlines. 

Não sabemos por onde anda o desastrado, mas o rastro deixado por ele foi um prejuízo da bagatela de R$420 milhões de reais. 

Episódios como este nos fazem refletir sobre a fragilidade das nossas redes, ao mesmo tempo que delegamos tanta importância e dependência a elas. 

Quem notou bem estes pontos foram os políticos autoritários que usam o controle das redes para manipular a população. Na Síria, o presidente Bashar Al Aassad regula em dias da semana quando a população que ainda resiste no país terá acesso à rede de água, energia elétrica e Internet. O mesmo faz o ditador norte-coreano Kim Jong-un limitando os acessos à Internet a castas raríssimas do seu povo, inclusive controlando a velocidade e conteúdo da conexão.

Em plena Primavera Árabe, em 2011, enquanto o povo egípcio lutava contra o poder autoritário nas ruas, grupos militantes se articulavam por blogs e hashtags convocando grandes movimentos e chamando a atenção global para os protestos. O Governo então decidiu cortar a conexão do país para controlar os protestos digitais. Atitude que foi copiada por outros países que enfrentavam o movimento popular durante a revolta contra a truculência e autoritarismo dos líderes de países árabes. A censura digital no Egito especialmente se tornou um caso emblemático, porém não parou lá.

Na última terça-feira, o governo da Etiópia fechou a torneira da conexão à Internet por 12 horas. Neste caso, o motivo é bem peculiar. Era dia do exame nacional, uma espécie de Enem. Às vésperas da realização da prova no ano passado, um grupo contrário à política local descobriu as questões e publicou nas redes sociais. Assim que o conteúdo viralizou, o governo mandou cortar temporariamente a Internet no país. Neste ano, decidiu agir em modo de precaução. Desligou as conexões antes mesmo de alguém pensar em compartilhar a prova. 

Medidas autoritárias como esta movem pesquisas, monitoramento e atitudes de institutos e organizações que protegem o acesso à conexão e informação. O Brookin Institution divulgou um relatório revelando que apenas no ano passado, 19 países tiveram cortes de acesso à rede registrando 81 quedas graves de conexão. O Brasil está na lista. De acordo com o instituto, as interrupções provocaram um prejuízo estimado em 2,4 bilhões de dólares.

Às vezes por questões políticas, outras por falhas técnicas ou até vandalismo. Como boa parte da conexão corre por cabos de fibra ótica subterrâneos, vandalismos ou roubos destes equipamentos podem impactar o acesso de milhares de pessoas. Em certos casos, o rompimento dos cabos ocorrem até por descuidos em escavações não autorizadas. 

Após uma longa viagem física e mental pelas redes globais, mergulhei em uma teia pra lá de prazerosa em uma das conexões de volta ao Brasil: as palavras de Valter Hugo Mãe no livro "A Desumanização" que acabei encontrando no aeroporto de Frankfurt, o que já fez valer todo transtorno aéreo.

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